Imagine uma empresa liberar toda sua mão de obra
para ir ao sindicato dos trabalhadores para um dia de aula sobre sindicalismo.
Imagine agora que a empresa, ou as empresas em questão, não são companhias
pequenas, mas empregadoras de mais de 70 mil trabalhadores. É o que vai
acontecer Fonte: Jornal Valor
Na Mercedes as inscrições para as aulas já estão
abertas. Os trabalhadores serão levados por ônibus ao clube de campo do
sindicato, onde ficarão por um dia inteiro em salas com televisões e
professores. "O mundo mudou. O sindicato, as empresas e o Estado mudaram
ao longo dos últimos 30 anos. E o trabalhador, mais jovem, não conhece essa
evolução", diz Sérgio Nobre, presidente do sindicato. A ideia vem sendo
discutida desde 2003 quando os membros eleitos nos comitês sindicais
constituídos em 96 empresas da região passaram a incluir a reivindicação na
pauta negociada anualmente. No ano passado, as montadoras e fabricantes de
autopeças concordaram em liberar seus funcionários para o curso. A Mercedes foi
a primeira a ratificar o acordo, no fim de junho.
Segundo Marcos Alves, diretor de administração de
pessoal da Mercedes Benz
Criticado no ano passado por conseguir reajuste
real nos salários inferior a outros polos automobilísticos, como São José dos
Campos, Campinas e Paraná, o presidente do sindicato do ABC avalia que "o
trabalhador precisa entender que o sindicato precisa andar junto da
região". Para Nobre, "não se pode afugentar as empresas e os
investimentos daqui, porque de outra forma o resultado seria pior para os
empregos".
Depois de atingir o fundo do poço em 2003, quando
a base de metalúrgicos na região do ABC atingiu 77,4 mil trabalhadores, o
momento é de aquecimento econômico. No mês passado, a região voltou a bater a
marca dos 100 mil operários, recuperando o patamar de 2008, então recorde da
década. "O emprego cresce e o trabalhador que entra é cada vez mais
jovem", diz Nobre.
Quase 20 mil trabalhadores da indústria
automobilística do ABC têm menos de 24 anos de idade. A parcela dos que têm
mais de 40 anos, ainda maioria - representando cerca de 35% do total - perde
espaço. Na Mercedes, a média de idade do trabalhador, segundo dados do
sindicato, é de 32 anos. "Isso quer dizer que a maioria nasceu no fim dos
anos 1970, justamente quando ocorreram as grandes greves e os conflitos do
sindicato com as empresas e o Estado. Agora a situação é completamente diferente
das últimas três décadas", diz Walter Souza, membro do comitê sindical na
Mercedes e coordenador do curso, chamado de "Programa Trabalho e
Cidadania".
Para dar conta do imenso contingente de
trabalhadores, o sindicato já se antecipou. No fim do ano passado comprou um
prédio nas cercanias de sua sede por R$ 1,5 milhão, em leilão municipal. O
prédio será reformado e deve ficar disponível para aulas no fim do ano. Além
disso, realizou em maio aulas-piloto, que serviram de teste para o material desenvolvido.
"Assistimos a filmes, fomos apresentados à história do sindicato e das
empresas e recebemos CD-ROM e apostilas", diz Priscila Lucena, que
trabalha na linha de montagem de caminhões da Ford e participou de uma dessas
aulas.
"Não só o sindicato, mas as empresas têm uma
história muito rica. As duas instituições são muito importantes para nossa
região e eu, que não venho de família de metalúrgicos, não conhecia nada
disso", diz Priscila. Com 25 anos de idade e pouco mais de dois na Ford,
seu primeiro emprego como metalúrgica, Priscila diz "conhecer agora seu
trabalho melhor".
Segundo dados do Departamento Intersindical de
Estudos e Estatísticas Intersindical (Dieese), o salário médio dos metalúrgicos
das quatro cidades representadas pelo sindicato do ABC - São Bernardo do Campo,
Diadema, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra - é de R$ 2,9 mil, sendo R$ 2,1
mil nas autopeças e R$ 5,1 mil nas montadoras - os mais altos da indústria no
país.